sábado, 23 de abril de 2011

NOSSA PÁSCOA.

P Á S C O A D A R E S S U R R E I Ç Ã O

“Nossa Páscoa, Cristo, foi imolada. Celebremos, portanto, a festa,
não com velho fermento, nem com fermento de malícia
perversidade, mas com pães ázimos: na pureza e na verdade”
(1ª aos Coríntios 5, 7-8).

Pelos anos 1250 a.C. ocorreu realmente a fuga (Êxodo 14, 5) de um grupo de escravos (hapirus=hebreus) do Egito (Êxodo 12, 38). Era naquela época um fato muito comum. Não foi o primeiro grupo nem o último que conseguiu assim se libertar da escravidão egípcia. Mas para esse grupo foi o início de uma longa história que seria a história de um Povo e por isso o fato se tornou o acontecimento fundador desse Povo, Israel. O que aconteceu exatamente ninguém sabe dizer, pois os textos que possuímos são vários e diferentes e são frutos de uma releitura constante, feita, sobretudo, num contexto litúrgico. Mas, o que nos importa é o significado que esse fato adquiriu para a vida de tantas gerações.

1. Um fato:
Podemos ler Êxodo 14, 29-31.
Páscoa é a Passagem pelas águas do Mar dos Juncos: “Ele jogou no mar cavalos e cavalheiros.” (Êxodo 15, 21).
Abriu-se um caminho de libertação: da casa da servidão para a terra onde corre o leite e o mel.

2. Significado Teológico:
Essa passagem das águas foi lida, interpretada, como a PASSAGEM DE DEUS na vida desse grupo que conseguiu se libertar (Êxodo 12, 12). Deus-Javé passou e libertou o seu Povo. Foi a passagem de Deus na História desses escravos, passagem que os levou da escravidão para a libertação: Deus interveio na História e se deu a conhecer como o Deus que liberta (Êxodo 3, 7-15; 15, 2-3).
Esse ato de Deus funda o Povo e fundamenta a sua fé (Deuteronômio 26, 5-11). Em qualquer época e em qualquer lugar o Êxodo dos antepassados continua o Êxodo dos Israelitas (no texto passa-se do “eles” para o “nós”). Esse fato alimenta a sua oração e liturgia (Êxodo 15, 1-21; Deuteronômio 16,1), como alimenta também a sua fé. Pois será este fato que será constantemente relido à luz dos novos acontecimentos da História. Vejamos o Segundo Isaías como ele descreve a volta do Exílio da Babilônia como um novo Êxodo (Isaías 43,16-21). A vocação de Elias se dá nos mesmos termos do que a vocação de Moisés (enfrenta o rei, lança praga, foge para o outro lado da torrente, é alimentado de pão e água, até voltar para profetizar...1º livro dos Reis 17, 1-6)
Podemos ler e meditar nessa mesma perspectiva o Salmo 118.



3. Significado Ético:
A Fé exige um comportamento, uma ética. Á passagem de Deus na sua História, o Povo vai responder pelo seu compromisso de vida. Ele vai PASSAR A SERVIR À DEUS.
Da servidão ao serviço: eis a grande transformação na vida desses escravos, é o sinal que tinha sido dado a Moisés no Monte Horeb (Êxodo 3, 12).
Israel passa a ser um Povo consagrado a Deus, passa a ser o Povo do Deus que liberta. É um povo consagrado para esse serviço (Êxodo 13, 11-16; 19, 3-8). A consagração de todo o Povo passa pela consagração dos primogênitos. Numa sociedade patriarcal, se o primeiro dos homens é consagrado a Deus, significa que todos os membros da família, do clã, da tribo, são consagrados a Deus.
Podemos nesse sentido ler e meditar os Salmos 15 e 112.
È nessa perspectiva também que temos que reler o Decálogo: a Fé num Deus que liberta e não há outro, gera a relação fraterna entre os membros deste mesmo Povo: Deus do Povo, Povo de Deus.


4. A Nova Páscoa:
Na sua primeira carta aos Coríntios, Paulo nos afirma que tudo o que aconteceu na Páscoa dos Hebreus é para nós “tipo”, ou seja, exemplo (1º Coríntios 10, 1-6 e 11).
Mas agora a nossa Páscoa não é mais um fato e sim uma pessoa: Jesus de Nazaré. Ele realiza a verdadeira Páscoa, plena e definitiva, Ele é a nossa Páscoa ( 1º Coríntios 5, 7-8).
Pela sua morte e ressurreição Jesus se tornou a única Páscoa capaz de realizar em plenitude o que a primeira anunciava. (João 13, 1; Lucas 9, 30-31; Colossenses 1, 13).
Jesus provoca uma nova passagem da morte para a vida, da escravidão para a liberdade, mas não é mais para um grupo e sim para a humanidade toda, não é mais a passagem de um lugar para o outro e sim de uma situação para outra em qualquer terra que seja. É a universalização da Páscoa: transformar a vida, a pessoa, o mundo... (João 2, 1-12 e 2, 13-22).
Pela sua prática (atos e palavras) Jesus revelou a libertação do Pai. Deus passou de novo libertando: “Ele passou no meio de nós fazendo o bem” (Atos 10, 38).Também nos convidou a entrar no seu caminho (andar=ética) a viver como dava o exemplo (Lucas 9, 22-26).

5. A nossa Páscoa, fonte de nossa espiritualidade:
Como os Hebreus reconheciam a Páscoa de Deus no Êxodo, assim nós reconhecemos a Páscoa de Deus na pessoa de Jesus Cristo. Deus passou no meio de nós, libertando e isso nos convoca para uma vida digna dessa Boa Nova que recebemos. A Páscoa de Jesus fundamenta a nossa fé e exige de nós uma ética.
Daí nasce toda uma espiritualidade pascal ou êxodal. Esta espiritualidade é dinâmica (os discípulos de Emaús estão a caminho; Jesus, segundo Lucas, empreendeu uma grande caminhada até Jerusalém, lugar de sua Páscoa (Lucas 9, 51) que é a sua assunção ou Êxodo (Lucas 9, 30-31: “eles falavam do seu Êxodo”- texto grego-). Encontrar a Cristo é começar a se movimentar como o cego de Jericó: “No mesmo instante ele recuperou a vista e seguia-o no caminho” (Marcos 10, 52). Mas para ressuscitar com Ele é preciso retomar o caminho desde o início (voltar à Galiléia: Marcos 16, 7) e subir até Jerusalém, até o Calvário da Cruz. Espiritualidade da Cruz.
Ela é uma espiritualidade vivencial, ela celebra a presença do Deus Libertador na História, nos acontecimentos pessoais e comunitários. Ela expressa a experiência transformadora que vive toda pessoa que encontra o Ressuscitado na sua vida. “Já não sou eu que vivo, mas o Cristo que vive em mim. Minha vida presente na carne, eu a vivo pela fé no Filho de Deus, que me amou e se entregou a si mesmo por mim” (Gálatas 2, 20). É a força da Ressurreição em nós (Filipenses 3,10).

Ela é missionária, pois leva ao testemunho da Ressurreição a partir da experiência pessoal do encontro com o Vivente: “Vi o Senhor” (João 20, 18), “Nós o reconhecemos à fração do pão” (Lucas 24, 35). A mesma experiência teve Paulo de Tarso, justamente no caminho de Damasco (Gálatas 1, 15-17), o Ressuscitado lhe foi revelado (Atos dos Apóstolos 9, 3-5). Foi a Páscoa em sua vida: ficou cego “três dias” (Atos 9, 9). Jesus passou na sua vida, enquanto estava na estrada, e foi a mudança radical do seu comportamento.

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Pelo Batismo nos identificamos ao Senhor morte e ressuscitado (Romanos 6, 3-11).
É a ressurreição que é o fundamento de nossa fé (1º Coríntios 15, 3-8; a proclamação da nossa fé pelo “creio”), e alimenta a nossa oração e nossa liturgia ( na vigília da Páscoa renovamos as promessas do nosso Batismo)
Pela fé na ressurreição entramos numa dinâmica de transformação (Filipenses 3, 11-14).
Paulo convida os Filipenses a ter uma vida digna do Evangelho (Filipenses 1, 27).
A vida religiosa é a radicalização da vivência batismal. É uma consagração a serviço de Deus e do seu Povo. Ficamos livres de tudo para servir. Podemos reler nessa perspectiva o nosso engajamento na vida religiosa.

E hoje? Como Deus está presente na História? Como Ele está libertando? Como esse olhar sobre a realidade me ajuda a proclamar a minha fé e alimentar a minha oração? Como estou à serviço desse mistério de morte e ressurreição? Como este mistério atua em minha vida, na vida da nossa comunidade?


“Assim, irmãos bem-amados, sejam firmes e inabaláveis (é a fé), façam constantes progressos no serviço do Senhor (é a ética), certos de que sua fadiga não é vã no Senhor” (porque Ele está vivo e nos conduz à vida) (1º Coríntios 15, 58).

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