Quaresma: Eis o tempo de conversão...
Cada ano a Liturgia da Igreja nos dá de reviver, atualizar, na realidade nossa, os principais momentos da História da Salvação. Assim com o tempo de Advento revivemos a espera do Messias junto com os profetas e os crentes fiéis ao Senhor, que esperam a Salvação-Redenção. Passamos depois a lembrar os primeiros momentos de vida do Salvador, Jesus de Nazaré: sua encarnação, e, o que costumamos chamar a infância de Jesus até chegar aos atos que abrem a sua vida pública: o Batismo por João nas águas do rio Jordão e as Tentações no deserto. Então vem o tempo da Quaresma.
O número 40 nas Escrituras Sagradas tem um simbolismo de “tempo completo, tempo suficiente para que se realize uma ação importante”. Assim o Dilúvio durou quarenta dias e quarenta noites (Gênesis 7, 12). Foi o tempo necessário e suficiente para fazer desaparecer a criação primordial (Gênesis 6, 7) e aparecer uma nova criação (Gênesis 9, 1-17; comparar com Gênesis 1, 26-31). Será o tempo necessário também para os hebreus, grupo liberto da casa da servidão, passarem (Páscoa) a ser Povo de Deus no estabelecimento de uma nova aliança (Êxodo 19, 2-8).
Será necessário que Moisés passe quarenta dias e quarenta noites na montanha (Êxodo 24. 18) para receber todas as instruções sobre o santuário e mais tarde para se encontrar com Deus face a face, como um amigo falando ao seu amigo e escrever de novo as tábuas da Lei (Êxodo 33, 11 e 34, 28).
Foi também o tempo necessário para o Profeta Elias se encontrar com deus no Monte Horeb e ser renovado na sua vocação profética (1º livros dos Reis 19, 8). O Profeta Jonas adverte aos Ninivitas que eles têm quarenta dias para se converterem (Jonas 3, 4).
Depois de quarenta dias e quarenta noites no deserto, Jesus está pronto par assumir a sua missão (Mateus 4, 1-2). Quarenta dias no deserto abrem a vida pública de Jesus, quarenta dias será também o prazo entre a Ressurreição e a Ascensão (Atos 1, 3) para encerrar o tempo do seu ministério na terra, a fim de dar aos seus discípulos provas incontestáveis de sua Ressurreição.
A Quaresma é o tempo favorável para a conversão. É o tempo de arrependimento e de penitência, tempo pelo qual podemos ressurgir como novas criaturas. Tempo que nos permite de voltar a ser membro fiel do Povo de Deus, saindo da escravidão do pecado para uma vida nova no Espírito do Senhor Ressuscitado, afinal reencontrar o primeiro amor do nosso Batismo (Romanos 6, 3-4). E assim retomar com generosidade o nosso compromisso missionário de anunciar pelo testemunho de vida o Reino do Pai.
Na Quaresma somos convidados também a nos preparar para encontrar o nosso Deus e Pai, ouvir de novo o seu Nome: “Javé, Javé, Deus de compaixão e de piedade, cheio de amor e fidelidade” (Êxodo 34, 6). Na Quarta Feira das Cinzas, pela leitura do Santo Evangelho, nos será proposto três caminhos para seguir a Jesus e ir com ele para junto do Pai: o jejum, a oração e a esmola. Jejuar nos diz o Profeta Isaias é o seguinte: “Por acaso não consiste nisto o jejum que eu escolhi: em romper os grilhões da iniqüidade, solta as ataduras do jugo, por em liberdade os oprimidos. Não consiste em repartir o teu pão com o faminto, em recolheres em tua casa os pobres desabrigados, em vestires aquele que tu vês nu e em não te esconderes daquele que é a tua carne...” (Isaías 58, 1-7). Jejuar é se abster de tudo o que pode prejudicar o irmão ou a irmã, é renunciar a atos que humilham, não respeitam a dignidade dos outros. A oração é este momento reservado de face a face com o Pai, como Jesus se retirando em lugar deserto para orar (Marcos 1, 37). Mateus nos aconselha nos retirar na intimidade do nosso coração. Viver com Deus ao ponto de chegar a uma unificação de vida como o Apóstolo Paulo: “Já não sou eu que vivo, mas é Cristo que vive em mim” (Gálatas 2, 20). Viver na intimidade do nosso Deus, escutando a sua Palavra como discípulo autêntico: “De manhã em manhã ele me desperta, sim, desperta o meu ouvido para que eu ouça como os discípulos” (Isaías 50, 4). Por isso é muito bom dedicar uns momentos à leitura das Sagradas Escrituras. A esmola não é aquilo que me sobra como faziam os ricos no Templo de Jerusalém, e sim aquilo que me é necessário, mas que eu divido com quem precisa como a viúva que depositou no cofre do Templo tudo o que ela tinha (Marcos 12, 41-44), ou com a viúva de Sarepta que repartiu o que lhe restava com o Profeta Elias (1º livro dos Reis 17, 12-16).
Percebemos que o jejum, a oração e a esmola são a resposta ás três tentações de Jesus no deserto. Tentações essas que estão constantemente presentes em nossa vidas: a sede de possuir, o consumismo, a orção-adoração em vista de ganhar alguma coisa, de até exigir de Deus, o egoísmo, que quer atrair sempre todas as atenções sobre a minha pessoa sem olhar as necessidades dos outros, concentrar tudo em mim mesmo sem repartir o que eu tenho.
Que nesta Quaresma possamos viver segundo o profundo sentido que trazem estes quarenta dias e quarenta noites: uma preparação para uma renovação de nossa vida de batizado, discípulo e discípula do Senhor Ressuscitado.